Para encerrar a cobertura Gostoso 2019, resta falar de um longa visto, o paraibano Ambiente Familiar, de Torquato Joel.
Torquato fazia cinema na Paraíba antes que o estado fosse reconhecido como novo polo cinematográfico. É um veterano, da geração dos anos 1980, junto com Marcus Vilar. Torquato Joel procura, desde os seus primeiros filmes, imagens e narrativas poéticas. Ambiente Familiar não é diferente. Três amigos procuram superar coisas mal resolvidas de seus passados, vivendo juntos, como uma família. Os flashbacks são pretextos para brincar com o enquadramento (1.33:1) e criar imagens impactantes, embora nem sempre inteligíveis. Normalmente a falta de inteligibilidade não interfere no nosso julgamento, principalmente quando for resultado de algum recurso artístico ou cinematográfico. Mas por vezes notamos que é apenas um atalho para não precisar estruturar melhor a narrativa. Em Ambiente Familiar, às vezes tive essa impressão. Mas no geral é bem digno, até por sua pesquisa visual. Não é um filme fácil, e dos quatro longas da Mostra Panorama, é o único que não ficaria bem na Mostra Competitiva (imagino a plateia na praia se dispersando e dispersando os espectadores interessados, não ia funcionar).
Finalmente, a Mostra de Cinema de Gostoso, em sua sexta edição, confirma sua vocação de importante festival de cinema brasileiro. Mas como escrevi no balanço publicado na Folha de S.Paulo, é necessário tomar cuidado com o crescimento, que é bacana e bem-vindo, mas traz consigo alguns perigos. No ano passado foram 450 cadeiras na praia. Neste ano foram 650, e as sessões continuaram lotando. Isso é bom, claro. Devem ser criadas condições de receber essas pessoas, porque seria bom que elas aparecessem, principalmente do estado potiguar – mas por que não de todo o Brasil? Mas a Mostra não pode perder sua cara, seu foco. Se ganhar mais um dia, um outro filme na competição não faria mal. Se Gostoso começar a exportar cineastas (o que já se revelou uma possibilidade concreta), deve-se cuidar para que o coletivo não perca seu foco e sua força, que está na humildade e na vontade de aprender. O coletivo Nós do Audiovisual é uma pepita que precisa ser cuidada com carinho. Pelo que vi neste ano, a Mostra está no caminho certo.
P.S.
Há ainda os filmes da Mostra Panorama que eu havia visto em outras ocasiões. Então seguem links para os textos que fiz sobre: Diz que me Viu Chorar, de Maíra Bühler (https://sergioalpendre.com/2019/06/08/olhar-de-cinema-dias-1-e-2/), A Mulher da Luz Própria, de Sinai Sganzerla (https://sergioalpendre.com/2019/06/11/olhar-dia-5-matsumoto-sganzerla-ignez/) e Chão, de Camila Freitas (https://sergioalpendre.com/2019/06/12/olhar-dia-6-enquanto-estamos-aqui-o-sol-queima-o-chao/).