Como reagiriam à obra de Marguerite Duras os antiformalistas que têm dominado a discussão sobre cinema nas redes sociais? Inventariam desculpas, decerto, para não recusar o cinema de tão nobre autora. Mas o fato é que essa cineasta francesa que nasceu na Indochina é uma das maiores formalistas do cinema, senão a maior. Para Duras, a questão é encontrar maneiras de driblar as formas narrativas clássicas e modernas. No romance, fez parte da mesma linhagem de Alain Robbe-Grillet, do nouveau roman que explodiu nos anos 1950. No cinema, está mais alinhada a geração pós-nouvelle vague de Pialat e Garrel, apesar do início ligado a Alain Resnais e da admiração por Godard. É alguém que chegou depois do apogeu do clássico e da dominação do moderno. Mas a questão para ela não é tentar reinventar em cima do já inventado. É, antes, a negação do cinema, e, paradoxalmente, sua exacerbação. Ao procurar fazer não cinema, mas uma outra coisa, Duras inventou uma forma realmente nova de fazer cinema, uma forma que encontra paralelos com cineastas como Fassbinder, Manoel de Oliveira, Raul Ruiz, Jean-Marie Straub e Danielle Huillet, e, como esses, faz cinema plenamente formalista. De fato, Duras faz um cinema que está em completa negação com o modelo industrial e comercial. É cinema que afronta a necessidade de se contar uma história. Talvez seja possível dizer que Duras é mais revolucionária no cinema que na literatura.
Se nos primeiros filmes prevalece alguma derivação do cinema já existente, sobretudo aquele mais próximo da diretora – um estilo que beira o impessoal em La Musica (1967), apesar de alguns traços característicos da cineasta já estarem presentes, de alguns planos que mostram um desejo de inventar formas, além da luz cinematográfica de Delphine Seyrig; Alain Resnais em Destruir Disse Ela (1969), um tanto derivado de O Ano Passado em Marienbad; Godard fase maoísta em Jaune le Soleil (1971), que também tem algo do Fassbinder inicial, a partir de Nathalie Granger (1972) o estilo burilado nos longas anteriores, com a fixidez da câmera interrompida por movimentos certeiros ou semi-circulares e um trabalho preciso com o som do que vem de fora do quadro, encontra sua maior expressão. Com esse filme de 1972, estrelado por Jeanne Moreau e Lucia Bosé e com uma participação marcante de Gérard Depardieu, nasce uma grande cineasta. Os filmes seguintes acompanhariam o altíssimo nível, culminando nessa obra única e magistral que é India Song (1975).
- TOP 5
- 1 – India Song (1975)
- 2 – Nathalie Granger (1972)
- 3 – Des Journées Entières dans les Arbres (1976)
- 4 – Son Nom de Venise dans Calcutta Désert (1976)
- 5 – Le Navire Night (1979)
obs: Dependendo do dia, o quinto lugar poderia ser ocupado por La Femme du Gange, Baxter Vera Vaxter ou Agatha et les Lectures Illimitées