Meu 1º dia no 14º Fest Aruanda: Dia de Desvio

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Quis o destino que a primeira vez que eu viesse acompanhar o Fest Aruanda, em João Pessoa, fosse em sua décima quarta edição. Como já disse aqui ou alhures, 14 é meu número de sorte. Apesar disso, o primeiro terço da viagem de avião foi tensa. Nunca peguei uma turbulência como aquela, e nunca ouvi tantos gritos no avião. Mas passou. Acontece com as nuvens pesadas dos trópicos. Na chegada, um pouco atrasado, deu para ver ainda a última sessão do dia, com dois curtas e um longa, todos em competição. Antes, houve uma homenagem a João Batista de Andrade, com uma fala entusiasmada de Vladimir Carvalho. (imagino que Linduarte Noronha tenha sido o homenageado na primeira edição)

Os dois curtas são Quitéria, de Tiago A. Neves, e Balão Azul, de Alice Gomes. O primeiro é paraibano e conta a história do renascimento de uma mulher, que vivia em preto e branco, mas por resolução própria e força de vontade, resolve romper o monocromatismo para descobrir a cor em sua vida. Um tanto trivial a simbologia, mas no curta até que se resolve bem. E o diretor ainda tem a audácia de um movimento de câmera acintoso no final, marcando o renascimento.

Balão Azul é um filme infantil, com poesia idem. Não é mal dirigido, mas também não apresenta nada que seja marcante. O curta me pareceu um descanso entre a intensidade de Quitéria e a do longa paraibano que encerrou a sessão, como uma faixa de melodia mais morna entre dois petardos em um disco de rock (e falar de rock vem bem a calhar na preparação para o longa).

Desvio é esse longa, e foi dirigido por Arthur Lins com um tom que lembra bastante os primeiros filmes do Wim Wenders. Para completar a ligação, basta trocar o rock sessentista dos Kinks e do Lovin’ Spoonful pelo hardcore underground paraibano. Não é fácil imprimir esse tom de recorte, uma coisa meio cotidiana meio acerto de contas, por todo o tempo, e é compreensível que o filme patine um pouco no começo. Mas também no começo (no primeiro terço, mais ou menos) fica claro que ele é capaz de fazer alguns voos, principalmente na relação dos primos Pedro, que teve um indulto de natal em seu regime de prisão semi-aberta, e Pâmela, adolescente que não quer seguir os rumos dos pais e suas festas em igreja. Há uma cena de assalto que não é de todo bem realizada, mas não compromete. O pós-assalto, com a queimação do carro é um dos pontos altos do filme, e o corte certeiro nos leva para longe dali, da noite para o dia, encerrando a sequência de um modo bem convincente. Essas escolhas de planos e cortes elevam o filme e promovem um crescendo interessante, culminando em um final prosaico que cabe bem ao longa. Uma surpresa (se é que dá para falar em surpresa relacionada ao cinema paraibano a esta altura).