Duelo de Gigantes

Minha primeira impressão com Duelo de Gigantes (The Missouri Breaks, 1976), muitos anos atrás, foi tão forte, de um filme tão perturbado pelo duelo de overactings entre Nicholson e Brando, que nunca tive coragem de revê-lo. Parecia-me um convite para o tédio instantâneo. Ainda mais porque a leitura de Robin Wood confirmava minha impressão. Ultimamente, contudo, para um trabalho sobre a Nova Hollywood, fiquei com vontade de rever. Parte do trabalho passou, mas ainda está em tempo. Na revisão, o que devemos fazer sempre, pois é muito mais importante do que contar com nossa memória, tive algumas surpresas:

a) o overacting não é tanto. Na maioria das cenas, aliás, sequer existe. Até que Brando entra em cena, com uma caracterização bem forte em um personagem que é antagonista e afetado. Se Hitchcock dizia que um bom vilão era charmoso, o de Brando é ridículo e caricatural. O efeito é outro, mas não deixa de ser interessante.

b) O que acontece é que o efeito cômico buscado nem sempre funciona da melhor forma possível. Em vez de graça, muitas vezes temos a impressão de que a cena desandou, de que Brando a sabotou. Penn parece trabalhar no caminho aberto por Butch Cassidy and Sundance Kid, mas a desconstrução do western pela comédia, num momento em que o western deixou de ser o gênero americano por excelência, raramente atinge um nível cinematográfico elevado. Basta ver todos os westerns feitos de 1965 em diante. Os melhores tendem a ser sisudos, ou muito violentos, como os de Peckinpah. Duelo de Gigantes sofre um pouco dessa incompatibilidade. Uma exceção é Banzé no Oeste, de Mel Brooks, embora seja uma paródia, enquanto o filme de Penn é um western tardio invadido eventualmente pela paródia.

c) o trabalho com o elenco, aliás, é bem melhor do que eu lembrava. Alguns atores em começo de carreira, ou ainda por se estabelecer no cinema, outros já célebres em filmes mais autorais: Frederic Forrest (que havia brilhado em The Don is Dead e A Conversação), Harry Dean Stanton (que já havia trabalhado com Monte Hellman), Kathleen Lloyd (atriz de TV em uma ótima estreia no cinema), para não falar de Randy Quaid, esse grande ator revelado por Peter Bogdanovich.

d) o lado humorístico do filme passa quase todo pela performance de Brando, de modo que reclamar de sua atuação exagerada é não entender o que sua presença na trama significa. O “regulador” como a pessoa mais descompensada e afetada de todo o filme. Para regular o quê? Seu personagem existe para tocar o terror. É um psicopata do século 20 assombrando os últimos sobreviventes do século 19. E Brando é tão bom que até num cômico afetado nos encanta.

Grande surpresa rever Duelo de Gigantes e perceber que é muito melhor que a tragédia que eu percebera num outro estágio de cinefilia.