O Melhor Está por Vir. É mesmo?

Dentro do PCI, Partido Comunista Italiano, há uma imagem de Stalin. Segundo o protagonista de O Melhor Está por Vir (Nanni Moretti, 2023), um diretor de cinema que realiza um filme sobre a história do PCI, Stalin foi um ditador, e por isso a imagem não será permitida em seu filme. Moretti, como sempre, deixa exposta sua verve crítica, mesmo contra a cartilha do partido que pretende homenagear.

Moretti é Giovanni, cineasta em crise, que passa por um doloroso processo de separação de sua esposa Paola, vivida por Margheritta Buy, embora ele só fique sabendo desse processo quando está avançado. Outra crise existe em sua relação com a atriz principal, que interpreta o roteiro como o de um filme de amor, não como um filme político revisionista do PCI como o que Giovanni quer fazer. Há um sentimento forte de nostalgia no filme de Moretti, o que o aproxima ao mesmo tempo de seu Aprile quando do cinema de Ettore Scola.

Mas é principalmente um cinema de outro tempo, uma espécie de lamento terminal. Quando Giovanni aceita a sugestão do personagem de Matthieu Amalric e se reúne com os executivos da Netflix italiana, o que ouve deles é a razão pela qual a plataforma está destruindo o cinema: “nossos produtos são vistos em 190 países”, “qual é a jornada do protagonista, qual é seu arco narrativo?”, “em seu filme falta um momento ‘what the fuck'”, e nesse momento a reação de Giovanni é impagável. Moretti vê a Netflix como um aglomerado de robôs que produzem enlatados envernizados de acordo com cada gosto: o autoral, o adolescente, o de mulheres idosas, o de famílias, de solteiros, de casais apaixonados. Pode-se chegar a algo digno, mas seria na base do contrabando ou da liberdade concedida a alguns autores consagrados (podemos desconfiar dessa suposta liberdade), grupo ao qual Giovanni não pertence.

Se com a Netflix não há acordo possível, o filme pode continuar graças a produtores coreanos, mais sensíveis ao que Giovanni quer mostrar. A sensibilidade gosto médio de Moretti marca presença com essa benção ao cinema coreano, mas há também seu lado adulto e o lado pessimista, intensamente crítico. Graças a eles, o filme tem sua força. Graças a uma anulação meio postiça desses impulsos (a não ser que eu tenha perdido alguma ironia), ficamos longe do memorável.